O Cotidiano de Antonio

Você sabia que para escrever a história, historiadores fazem análise de documento?

Eles reúnem textos do período que estão estudando e a partir deles fazem intepretações do passado. Esta será a sua tarefa: desvendar as pistas da documentação e criar uma narrativa para contar a história de Antonio. Para isto, siga as etapas abaixo. Quando tiver reunido todas as pistas possíveis, é hora de criar sua narrativa!

Antonio da Costa Peixoto foi um africano que viveu na cidade de Nossa Senhora do Desterro, que hoje é chamada de Florianópolis/SC, na metade do século XIX. Em determinado momento de sua vida, não sabemos afirmar quando, conquistou sua liberdade. O que significava esta palavra para um homem que havia atravessado o oceano Atlântico, para viver no Brasil na condição de escravizado e, provavelmente por anos, lutar para ser um homem livre novamente? Vamos descobrir.

 

 Primeira Etapa

            Viver em uma sociedade na qual a escravidão era permitida não deveria ser fácil para Antonio e nossos outros personagens. Ele foi um, entre vários outros naquele período, que provavelmente conseguiu comprar sua carta de alforria, pagando uma quantia ao seu senhor ou senhora pela sua liberdade.

Como sabemos que Antonio era um homem liberto? Veja nos trechos abaixo como as autoridades e testemunhas se referem a ele.

Constando a este juizo de orphãos que em dias da semana próxima passada, fallecera intestado e sem herdeiros, nesta cidade em casa em casa de Duarte Teixeira da Silva o preto Antonio liberto

Fonte: Arrecadação dos Bens do preto de nação Antonio liberto, 1862 a 1872, Desterro, Capital da Província de Santa Catarina, fls. 2.

Diz o Cirurgião José Ferreira Lisboa, morador nesta cidade, que sendo chamado para medicar o preto liberto Africano de nome Antonio, que se achava doente em Casa de Duarte Teixeira da Silva...

Fonte: Arrecadação dos Bens do preto de nação Antonio liberto, 1862 a 1872, Desterro, Capital da Província de Santa Catarina, fls. 8.

Diz Manoel José Machado, mor em Itacopé Frega de Santo Antonio, que ficando-lhes a dever o finado Anto da Costa Peixoto preto liberto, a quantia de 59#000 dedro de empréstimo.

Fonte: Arrecadação dos Bens do preto de nação Antonio liberto, 1862 a 1872, Desterro, Capital da Província de Santa Catarina, fls. 10.

            Se você for até a trajetória de Augusto vai saber um pouco mais sobre as identificações dadas a este sujeito.

            Por que era importante para Antonio ter especificado na documentação que era um homem liberto? Redija uma justificativa para explicar este fator.

 

Segunda Etapa

            Leia os depoimentos de alguns conhecidos de Antonio, chamados pelo Juízo de Órfãos e Ausentes em decorrência do falecimento de nosso personagem, a fim de descobrir mais informações sobre o mesmo.

Frederico Alves Correa, um conhecido de Antonio, afirmou:

sabia quanto aos bens do fallecido que elle hua [uma] vez por outra comprava e vendia café [mas não sabia se] esse café era produzido nas terras do mesmo defunto.

Fonte: Arrecadação dos Bens do preto de nação Antonio liberto, 1862 a 1872, Desterro, Capital da Província de Santa Catarina, fls. 6.

Duarte Teixeira da Silva, cidadão com quem Antonio morava, afirmou que ele possuía os seguintes bens em sua casa:

 

uma caixa de madeira sem ferrolho com um par de sapatos de cano de lustro; Vinte e três braços de terras com frente ao Cacupé, na freguesia de Santo Antonio.

Fonte: Arrecadação dos Bens do preto de nação Antonio liberto, 1862 a 1872, Desterro, Capital da Província de Santa Catarina, fls. 4.

Antes de continuar, você precisa saber de dois fatores importantes:

1.      Naquele período, ter sapatos era um indício da condição de liberdade. Já notou em pinturas históricas que mulheres e homens na condição de escravizados estão sempre descalços? Aí está o motivo.

2.      Possuir terras também era um sinal de distinção. Geralmente, pessoas na condição de escravizadas não tinham acesso a um imóvel ou terreno.

Qual relação podemos fazer entre os dois depoimentos? Eles nos ajudam a compreender o significado de liberdade para Antonio? Escreva você mesmo um depoimento com suas conclusões.

 

Terceira Etapa

            Está na hora de saber mais sobre os locais por onde Antonio circulava, talvez isto possa te dar mais pistas sobre as suas experiências. E sobre este conceito, a trajetória de Manoel pode te auxiliar a compreendê-lo.

Era no Bairro da Tronqueira, na Rua do Vigário que Antonio da Costa Peixoto morava. Este era considerado um bairro de pobres, aonde viviam pessoas livres e escravizadas. Em frente à rua da Tronqueira, perpendicular à rua onde Antonio morava, nosso outro personagem, Francisco de Quadros possuía uma morada. Observe o mapa abaixo e imagine o andar de Antonio pelo local.

 Fonte: CARDOSO, Paulino de Jesus Francisco. Negros em Desterro: Experiências de populações de origem africana em Florianópolis na segunda metade do século XIX. Itajaí: UDESC; Casa Aberta, 2008, p. 68.

Naquela época, a ilha de Santa Catarina, hoje Florianópolis, era dividida por espaços chamados de Freguesias. Mas as terras que possuía em seu nome, localizavam-se na freguesia de Nossa Senhora das Necessidades e Santo Antonio.

            Imagine o cenário da freguesia de Nossa Senhora do Desterro: as ruas eram locais de intensas atividades, nas quais muitos africanos, africanas e afrodescendentes trabalhavam de ganho, na maioria das vezes para acumular uma quantia suficiente para comprar sua liberdade ou simplesmente para sobreviver no contexto escravista da época. Era comum observar africanas e crioulas como quitandeiras vendendo seus produtos ou como lavadeiras, se utilizando dos vários riachos que a geografia da cidade apresentava; sem contar as cozinheiras e domésticas que perambulavam nos mercados, cuidando das crianças, dos seus senhores e senhoras. Os homens, por sua vez, apareciam vendendo e carregando mercadorias pelo cais do porto, ou exercendo funções relacionadas às atividades marítimas. Você pode descobrir mais sobre o porto de Desterro em um outro ponto deste site.

            Já a freguesia de Santo Antonio tinha uma característica mais rural, onde se produziam arroz, farinha, milho, açúcar entre outros produtos de subsistência. Nela também viviam africanos, africanas e afrodescendentes.

            A partir dos rastros que seguiu até aqui, você consegue supor qual era o ofício de Antonio? Já pode começar sua narrativa escrevendo como seria um dia de trabalho de nosso personagem.

 

Quarta Etapa

            Para compreender mais sobre a trajetória de Antonio e o significado da liberdade, siga mais algumas pistas da documentação.

          Para comprar os 23 braços de terra no Cacupé, Antonio precisou fazer um empréstimo de 59 mil réis com Manoel José Machado, morador da freguesia de Santo Antonio. 

           Quando adoeceu, Antonio precisou de cuidados médicos. Assim, o cirurgião José Ferreira Lisboa lhe fez várias visitas e medicações. Porém, não conseguiu fazer o pagamento devido a ele antes de falecer. 

Duarte Teixeira da Silva, com quem Antonio morava, disse ainda que ele possuía uma dívida com o pedreiro Angelo, pelos serviços prestados; e com Damázia, escrava de Dona Ignacia.

Você já deve ter notado que possivelmente Antonio vivera por bastante tempo em Nossa Senhora do Desterro para construir vínculos de solidariedades e, a partir deles, obter crédito na praça. Aliás, com a trajetória de Francisco você irá descobrir o que são estes vínculos.

Agora você já tem algumas pistas sobre a trajetória de Antonio. Está pronto para criar uma narrativa que conte sua história!

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